Olá, meu
nome é Wagner Elias e sou profissional dos quadrinhos com mais de 15 anos de
experiência na área. Sou autor de obras como Escarra Brasa, Divisão
5 e Colatino Caça Tretas. Durante todo esse tempo, trabalhando em
diversos projetos, eu percebi que muitos artistas iniciantes têm dificuldades
em criar histórias curtas, ou oneshots,
como são conhecidas.
A verdade é
que essa dificuldade não é surpreendente afinal, em um número limitado de
páginas, é preciso apresentar uma história completa com início, meio e fim,
além de personagens bem desenvolvidos e um enredo envolvente. Porém, é
justamente essa limitação que torna a criação de oneshots tão interessante e
desafiadora.
Por isso,
decidi criar este manual para ajudar esses artistas a desenvolverem suas ideias
e transformá-las em histórias de sucesso. Eu estou animado em poder
compartilhar um pouco do que aprendi ao longo da minha carreira, desde a
construção de personagens até o desenvolvimento do roteiro.
O mais
importante é que você desenvolva seu próprio método e sua própria abordagem
para criar histórias curtas. A prática é a melhor forma de aprimorar suas
habilidades de roteirização, então não tenha medo de experimentar e testar
diferentes técnicas até encontrar aquelas que funcionam melhor para você.
As imagens usadas neste manual são
todas de propriedade do estúdio e são partes de obras produzidas por nós. Se
você quiser ter acesso a elas, acesse o nosso site: https://gibitales.wixsite.com/gibitales ou pelo Qrcode:
01
Defina a ideia
“Uma boa ideia pode se transformar em uma péssima história se
não for bem contada.”
A etapa de definição da ideia é uma
das mais importantes no processo de criação de uma história curta. É essencial
que você tenha uma ideia objetiva e clara, que possa ser resumida em uma única
frase, que podemos chamar também de “assunto”, conforme definido por Syd Field
em seu livro Manual do Roteiro. O autor define “assunto” como a declaração
geral do que a história se trata, e essa declaração deve ser específica e
objetiva. Em resumo podemos ter a seguinte fórmula:
Quem é o personagem + o
que acontece com ele + qual seu objetivo = IDEIA.
Por exemplo, em Egoman
– O Inofendível Herói, temos uma ideia bastante simples:
Douglas Santos, um
garoto comum, tem sua vida mudada quando ganha o poder de ser imune a qualquer
tipo de ofensas. Agora ele vai passar a defender as pessoas contra os insultos
da vida sob a identidade do herói Egoman.
Temos aí o personagem, o que acontece com ele e qual seu objetivo.
Pronto, uma ideia.
Definir a
ideia é importante porque ela vai nortear toda a sua história. É a partir dela
que você desenvolverá a trama, os personagens e os conflitos! Além disso, uma
ideia bem definida ajuda a evitar a dispersão da história e a manter o foco na
ideia central.
02
“O
personagem é a alma da história.”
Pode-se dizer que o personagem é a alma da história, afinal é
ele quem vai guiar o leitor no decorrer das páginas. Se o personagem não
desperta o interesse de quem está lendo, as chances de a pessoa abandonar a obra
serão altíssimas!
Para criar personagens interessantes, é importante fazer
perguntas que ajudem a definir sua gênese. Quem é esse personagem? Qual é a sua
história de vida? Quais são seus desejos e medos? Como ele se relaciona com os
outros personagens da trama?
A resposta a essas perguntas ajuda a dar forma ao personagem,
tornando-o mais realista e convincente. Lembre-se de que o objetivo aqui não é
criar uma biografia completa para cada personagem, mas sim dar a eles uma certa
profundidade que ajude a engajar o leitor na história.
03
Desenvolva a História
Após definir a ideia central da história, é hora de começar a
desenvolvê-la. É nesta etapa que o autor tem a oportunidade de explorar todas
as possibilidades da e deixar a imaginação fluir sem muitos critérios.
Durante o desenvolvimento, é preciso que o autor escreva sem
muita preocupação com a qualidade do texto ou com as limitações do formato
escolhido. É como uma espécie de "brainstorming" onde você vai
incluir todas as ideias que vierem à mente sem julgamentos nem restrições, de modo
que o autor se permita errar, escrever excessivamente ou até mesmo mudar
completamente a direção dos acontecimentos. Isso vai ajudar a expandir o
universo da obra, explorar os temas propostos e desenvolver nuances que
aprofundem a experiência do leitor.
A flexibilidade proporcionada nessa etapa permite ao autor
corrigir erros, ajustar o ritmo narrativo e até mesmo mudar a direção que a
história está tomando, caso seja necessário. Essa liberdade criativa é valiosa,
pois muitas vezes é durante esse estágio que surgem as melhores ideias, reviravoltas
surpreendentes e momentos marcantes que definem a identidade da obra.
Com um texto bem desenvolvido e repleto de ideias
interessantes, você terá muito mais facilidade para lapidar seu roteiro e
transformar sua história em um verdadeiro sucesso!
04
Pesquise
“A
qualidade da sua história é proporcional ao conhecimento que você tem sobre o
assunto.”
Durante o desenvolvimento do seu oneshot é comum que surjam
dúvidas sobre elementos que estão presentes na trama, sobre os quais o autor
tem pouco ou nenhum conhecimento. Caso seu oneshot envolva cenários históricos,
culturas específicas, profissões, etc. você vai querer evitar erros e
imprecisões que possam distrair ou desapontar os leitores! Por isso é essencial
fazer uma pesquisa para garantir que esses elementos estejam bem fundamentados
e tragam credibilidade para a história.
Por exemplo, talvez
você precise pesquisar sobre o funcionamento de uma entidade pública como a
polícia federal, ou os processos envolvidos em uma audiência judicial, ou ainda
como é a rotina de uma banda de rock. Enfim, qualquer coisa que vá aparecer na história
e você não tem conhecimento suficiente a respeito, pesquise.
É claro que alguns autores preferem criar seus próprios
mundos onde é possível maior liberdade criativa e menos compromisso com a
realidade. Mesmo assim será preciso se basear no mundo real para criar o seu
próprio – a pesquisa continua importante.
Ao escrever Divisão 5
(oneshot), o Rafa Santos precisava retratar organizações secretas fictícias,
mas ele precisou pesquisar sobre organizações secretas reais e teorias da
conspiração para criar o seu próprio universo de mistérios.
Além disso, a pesquisa também pode ser útil para inspirar
novas ideias e ajudar a desenvolver elementos da trama que ainda não estão bem
definidos. Ela amplia seu conhecimento e pode desencadear sua criatividade,
permitindo que você crie tramas e personagens mais interessantes! Por isso, não
deixe de dedicar um tempo para essa etapa importante da criação de um oneshot.
05
Argumento
“Um bom roteiro precisa ser bem
lapidado.”
O argumento é a etapa final antes da escrita do roteiro, onde
o autor organiza todas as ideias que desenvolveu até agora e as coloca em um
formato estruturado. É a partir do argumento que a história começa a ganhar uma
forma mais concreta.
Ao escrever o argumento, é importante manter em mente a
estrutura da narrativa, que deve ser clara e objetiva. O argumento é uma
espécie de esboço da história, onde são definidos os principais eventos e
momentos da trama, mas ainda sem muitos detalhes.
Essa etapa é fundamental para que o autor possa identificar
possíveis falhas e fazer ajustes antes de escrever o roteiro final. Além disso,
o argumento também é uma forma de apresentar seu trabalho a outros
profissionais, como desenhistas e editores, para que eles possam compreender
melhor a trama e ajudar na criação da obra.
Para escrever um bom argumento, o autor deve se basear nas
ideias que desenvolveu durante as etapas anteriores e estruturá-las de forma
coerente e clara. Nessa fase, o autor deve ter bem definido o seu objetivo com
essa obra. Qual o gênero? Qual público pretendo atingir? Que tipo de mensagem
pretendo passar? Essa ideia já foi feita antes? Como posso acrescentar algo de
novo? É preciso ter em mente que, mesmo no argumento, é necessário já ter uma
visão clara do desfecho da história, pois isso ajudará a guiar a escrita do
roteiro final.
Mas lembre-se, nessa etapa você precisa ser desapegado e
fazer os cortes necessários, sem ter pena de retirar personagens ou elementos
que não sejam essenciais para a trama. Afinal, em um oneshot, o espaço é
limitado e cada elemento precisa ser utilizado de forma estratégica.
Trecho do primeiro texto escrito para Escarra Brasa, o
Cangaceiro Gentil - Emboscadas
Página de Escarra Brasa, o Cangaceiro Gentil -
Emboscadas
06
“Sem uma boa estrutura nada se
sustenta.”
Escolher a estrutura narrativa antes de começar a escrever é
fundamental, mesmo em uma história curta. Essa etapa é importante pois é o que ajudará
o autor a organizar os acontecimentos do enredo. Existem diversas estruturas
narrativas e cada uma delas tem suas particularidades e pode ser mais adequada
para diferentes gêneros.
No entanto, neste manual, apresentarei a estrutura narrativa
que eu utilizo em meus mangás. É uma estrutura simplificada que vai ajudar você
em seus primeiros passos, mas nada impede que você continue estudando outras
estruturas narrativas a fim de aperfeiçoar sua escrita. Dito isto, vamos à
ação!
ESTRUTURA
NARRATIVA RELÂMPAGO!
1.
Apresentação do personagem: Nesta
fase, apresente o protagonista da história e dê algumas informações básicas
sobre ele. Explique quem é, o que faz, suas motivações, medos e desejos. É
importante que o leitor se identifique com o personagem para que a história
tenha um impacto emocional mais forte.
2. Quebra do
cotidiano: Tire o personagem do seu cotidiano colocando-o em uma
situação anormal. É nessa etapa que você vai definir qual o objetivo do
protagonista dentro da história contada. E esse objetivo estará diretamente
ligado a um acontecimento incomum que tirará o personagem de sua rotina
habitual. Por exemplo: Em Cellatrix, o protagonista leva uma
vida normal quando, de repente, recebe um chip de celular com propriedades
incríveis que viram sua vida do avesso. Seu objetivo agora é conseguir pontos
em jogos arriscados para cancelar o plano e voltar à sua vida normal.
3. Conflito: O conflito
é a principal fonte de tensão na história. É o que impede o personagem de
alcançar seu objetivo. O conflito não vai, necessariamente, representar o mal,
mas é apenas o obstáculo que estará entre o protagonista e seu objetivo. Por
exemplo, em Star Trash os protagonistas são alienígenas que estão tentando invadir
a Terra, mas todas as excentricidades do carnaval carioca põem-se como obstáculos
para esse objetivo.
4. Clímax: O clímax é
o ponto mais alto da história, onde o conflito atinge seu ápice. É o momento em
que o personagem toma uma decisão crucial ou
5. Plot twist: é um
elemento surpresa que acontece próximo ao final da história. É uma reviravolta
que muda completamente o rumo da trama. Pode ser uma revelação sobre o passado
do personagem, uma mudança repentina de perspectiva ou uma virada na trama que
ninguém esperava. Mas cuidado, não force
a barra. Um acontecimento inesperado precisa ter relação com a história que
está sendo contada, do contrário, parecerá que o autor se perdeu na narrativa.
6.
Resolução: A
resolução é o desfecho da trama. É o momento em que o conflito é resolvido e o
personagem alcança seu objetivo ou aprende uma lição importante. A resolução
não precisa ser, necessariamente positiva, mas ela deve fechar a história de
forma completa. O protagonista conseguiu escapar da polícia ou morreu tentando?
Impediu que o assassino matasse a criança ou falhou na missão? O vírus foi
erradicado ou a população da Terra foi extinta? O estudante passou no
vestibular ou desistiu de tentar e abriu uma loja de doces? O final não precisa
ser favorável ao protagonista, mas precisa ser satisfatório para o leitor.
07
“Um roteiro bem escrito pode ser determinante para o sucesso da história.”
Finalmente
chegou o momento de escrever o roteiro! Com o argumento definido, você tem um
mapa que vai guiá-lo na construção de um bom roteiro. Em termos práticos, o
argumento apresenta o que acontecerá na história. Já o roteiro descreve
detalhadamente como isso acontecerá.
Ex:
Trecho de argumento:
O grupo
caminha pelas ruas vazias enquanto um barulho de multidão (festa carnavalesca)
ecoa pelo ar. Os membros da equipe conversam entre si, especulando sobre os
motivos de a cidade estar aparentemente deserta. Enquanto conversam, são
surpreendidos com algo ameaçador que surge em sua frente.
Perceba que nesse trecho você consegue saber o que vai
acontecer, e até tem alguns detalhes da cena, mas são detalhes ainda rasos.
Note abaixo
a mesma cena, mas desta vez, descrita no roteiro:
Pag. 1
- Quadros 1-3 – Mostrar
aspectos diferentes das ruas da cidade. As ruas estão vazias e tranquilas. Um
barulho ecoa no ar. É o som de uma multidão em festa de carnaval (lalaia ou
algo assim).
- Quadro 4-
Visão aérea. Panorâmica.
O grupo
está reunido em uma rua larga e totalmente vazia. Eles parecem estar se encontrando
após terem feito um breve patrulhamento nos arredores.
Ebzo- caminhamos
todo esse tempo sem encontrar qualquer forma de vida humana! Onde eles estão? E
que barulho é esse?
Príncipe
Nuki- o que tem a dizer sobre isso, mordav?
Mordav- a
probabilidade de ser uma emboscada deles é quase nula, senhor. Eu cuidei
pessoalmente disso.
- Quadro 5- Plano
americano. Mordav continua sua fala com um ar de autoridade, como quem sabe o
que está falando.
Mordav- não há
forma alguma de termos sido detectados, pois o sistema foi...
- Quadro 6-
Mostrar os outros 4 membros da equipe assustados.
- Quadro 7-
Close em Mordav. Ele esboça um sorriso insosso e meio confuso.
Mordav- tão me
olhando assim por quê?
Portanto, o autor deve ser o mais
objetivo e claro possível, descrevendo cada quadro, enquadramento, balão de
diálogo e ações dos personagens. Dessa forma, o desenhista terá um material
consistente para trabalhar e o resultado será uma história bem amarrada e
visualmente coerente.
Lembre-se
sempre de que criar histórias é uma jornada criativa e pessoal, e que a prática
e a persistência são fundamentais para aprimorar suas habilidades de
roteirização. Não tenha medo de experimentar e testar diferentes técnicas e
abordagens, e nunca pare de aprender e se desenvolver como escritor.
Com as
técnicas e sugestões apresentadas neste manual, você tem todas as ferramentas
necessárias para criar histórias curtas e envolventes, mas o sucesso depende
principalmente da sua dedicação e paixão pelo que faz. Então, mãos à obra!
Pegue sua caneta e seu papel, ou seu software de escrita favorito, e comece a
criar suas próprias histórias.
Tenho
certeza de que, com a prática e a dedicação, você vai se tornar um roteirista
cada vez mais habilidoso,
Desejo a
você todo o sucesso em sua jornada criativa, e que suas histórias sejam capazes
de inspirar e encantar seus leitores. Obrigado por acompanhar este manual, e
até a próxima!
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